terça-feira, 14 de janeiro de 2014

De volta aos palcos

No dia do meu aniversário de nove anos, eu recebi um presente que se tornou meu xodó por meses. Não era nada demais, só uma caixinha de música que sempre que eu levantava a tampa, uma bailarina saia e dançava uma melodia barata. A contar daquele dia, a primeira coisa que eu fazia ao acordar sempre era ver a minha bailarina dançando. E, um dia, depois de eu me adaptar e inserir esse espetáculo à minha rotina, eu sem querer bati a tampinha da caixa de música forte demais e quebrei a perna da minha nova amiga. Criança e chorona desde sempre, fiquei mal vários dias. Minha mãe comprou outra caixa de música pra mim, mas mesmo com toda a boa intenção dela, não tinha o mesmo valor, porque não era a minha bailarina, só uma substituta. O tempo passou e eu deixei aquilo de lado, até hoje. Passados poucos dias do meu aniversário de 21, eis que me encontrei num momento de nostalgia e vontade de fazer as coisas mudarem. Nem lembrava mais do meu brinquedo favorito, mas revirando as velharias na despensa, a caixinha estava lá, junto da bailarina e sua perna quebrada. Eu a colei. Eu a vi dançando de novo, ainda que com o som meio enferrujado da sua casa velha. Minha bailarina dançava com a mesma graça de sempre, por mais que agora tivesse um remendo pouco sutil. Sabe, aquilo foi quase uma epifania, vê-la ali, 12 anos depois. Arrancou meu primeiro sorriso sincero em dias, trouxe de volta um sentimento de aconchego que eu não sentia há um bom tempo. O fato de a minha bailarina dançar de novo depois de tanto tempo, fez-me perceber que eu também posso continuar a dançar, eu nunca quebrei uma perna. Mesmo com toda a bagunça, com todo problema e toda tristeza, minhas duas pernas estão inteiras e eu tenho a vantagem de não precisar que ninguém abra a caixinha para eu poder dançar. O mundo sempre esteve aberto pra mim, minhas pernas sempre estiveram em perfeito estado e já passou da hora de eu começar o meu balé.